A presidente do Banco do BRICS criticou o 'tarifaço' de Trump, apontado como ''ilógico e destrutivo'', e posicionou a China como exemplo de autonomia: forma mais cientistas ''do que todos os países da OCDE juntos''.
Durante o seminário "BRICS no Brasil: perspectivas e desafios", promovido nesta terça-feira (20) pela Fundação Perseu Abramo, a presidente do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), Dilma Rousseff, abordou o papel da China no cenário económico internacional e questionou as estratégias de reindustrialização adotadas por países como os Estados Unidos.
"Um problema é a sustentabilidade fiscal dos EUA. Os Estados Unidos atingiram um nível de dívida de 37 trilhões de dólares. A grande dúvida é se os Estados Unidos atingiram, ou não, um ponto em que esse essa dívida passa a ser difícil de ser financiada. Quando Trump recua e prorroga a vigência das tarifas mais ilógicas e destrutivas que já se viu, após a o turbilhão no mercado financeiro, isso provocou uma reação generalizada do mercado", contextualiza.
"Mesmo considerando que ao recuar o Trump conseguiu recompor os mercados de ação e o mercado de títulos, é inegável que ele deixou algumas marcas profundas, porque o mercado detesta incerteza e detesta também essa imensa fragilidade do ir e vir, e essa situação indefinida que hoje muitos países enfrentam", afirmou Dilma ao abrir a sua análise sobre o atual reposicionamento global e os desafios enfrentados pelas potências tradicionais diante do avanço tecnológico chinês.
Na sua intervenção, Dilma destacou a capacidade de formação profissional chinesa: "A China forma mais pessoas, mais engenheiros, mais profissionais nessas áreas do que todos os países da OCDE juntos. Então você tem uma condição de implementar uma situação diferente e nova hoje".
A presidente do NDB avaliou que as ameaças comerciais dos Estados Unidos à China já não produzem o mesmo efeito de anos anteriores. "Os dias em que os Estados Unidos conseguiam intimidar a China com ameaças de tarifas e sanções, parece, e isso ficou bem aparente na reação chinesa às tarifas de 145%, que acabou, ficando para trás".
Ela citou a mudança no destino das exportações chinesas como reflexo dessa nova dinâmica. "Atualmente, cerca de apenas 15% das exportações chinesas tem os Estados Unidos diretamente com destino. Uma fatia menor do que aquela que é direcionada para ASEAN, a Associação das Nações do Sudeste Asiático".
Segundo Dilma, as exportações chinesas aos EUA estão concentradas em setores de baixo valor agregado. "E no caso dos Estados Unidos, você tem hoje essas exportações em áreas como montagem de iPhones, produção de camiseta para o Walmart, tênis da Nike, setores de baixa remuneração".
Em contrapartida, ela apontou a presença global da indústria chinesa em áreas estratégicas. "Enquanto isso, as peças chinesas estão espalhadas pelo mundo, o maquinário chinês está espalhado pelo mundo, os produtos chineses competem com alta qualidade tecnológica".
Dilma afirmou que, para a China, a pressão económica norte-americana perdeu força. "Em resumo, do ponto de vista chinês, a versão 2025 do grande porrete já não parece tão assustadora como aquela de 17, pelo menos do ponto de vista económico".
Ao tratar da reindustrialização, Dilma questionou a viabilidade de estratégias baseadas em tarifas. Para ela, impor barreiras comerciais não é eficaz. "Não parece ser eficaz impor tarifas pesadas sobre os produtos do resto do mundo, europeu, japoneses e chineses. Mesmo correndo o risco de provocar uma recessão global, isso não leva à reindustrialização".
Dilma concluiu que o processo de reindustrialização exige planeamento e tempo. "Em qualquer caso, reindustrializar exige muito mais do que decretos tarifários e medidas de correção. Principalmente exige um tempo. Um tempo para voltar a ser capaz de fazer tudo que se deixou de fazer ao longo dos últimos 20, 30 anos.”
Segundo ela, o protecionismo não contribui para relações sustentáveis entre países. "E não é algo que se resolve com canetadas protecionistas, porque o protecionismo não beneficia os países com os quais se deve propor uma relação".
A presidente do NDB finalizou a sua intervenção chamando a atenção para a responsabilidade brasileira nesse cenário. "Hoje nós temos que ter tanto perguntas quanto respostas. Mas nós temos de ser capazes de fazer todas as perguntas possíveis de serem feitas diante do quadro que nós estamos vivendo. E não é um quadro nacional só", pontua.
"Nós do Brasil temos a mania de olhar só o Brasil, sendo que o que ocorre no mundo afeta o Brasil profundamente. Nós estamos vendo isso na questão, por exemplo, das tarifas de 20% no aço e no alumínio", concluiu.
Fonte: https://rtbrasil.com/noticias/12973-trump-vai-conseguir-reindustrializar-eua/